sábado, 14 de março de 2009

ESTÊVÃO HORÁCIO DO PRADO.

QUEM FEZ A NOSSA HISTÓRIA?

A história de uma comunidade é feita por todos nós e não pode ser encarada como obra somente dos políticos ou dos vultos que já destacaram nos livros que lemos. Os heróis são múltiplos. E, no rol deles cabem todos, inclusive aqueles que a história escrita esqueceu de registrar.Na minha opinião, até o mais simples operário de uma obra, aquele profissional de destaque, além dos doutores devem fazer parte desse registro de resgate.Como exemplo, cito o meu avô materno que nem conheci. Ele fora um operário da primeira Prefeitura de Cambuquira.

Este personagem histórico não consta em nenhum livro e nem é nome de nenhum logradouro público. Não que ele deixasse de fazer jus a uma homenagem dessa natureza, mas muito mais pelo fato de que num passado bem próximo ainda era incomum dar esse tipo de honraria às pessoas mais simples.

Estevão Horácio do Prado, avô do administrador deste blog e de um grande número de outros cambuquirenses e descendentes, foi o patriarca de uma parte da Família Prado em nossa cidade. Líder nato conforme ouvi dizer, destacou-se desde já, sem ser portador de algum título de formação, tornou-se o ponto de referência entre aqueles que trabalhavam com ele. Notado pela administração, inclusive talvez por ser um dos poucos alfabetizados do grupo, ficaria incumbido mais tarde de comandar um grupo de operários nas obras do então município em formação.

Casado com Maria do Carmo Rezende do Prado, conhecida na comunidade como "Dona Mariinha", Estêvão faleceu cedo deixando viúva e seus oito filhos, que foram criados graças ao empenho do filho mais velho, Sebastião Evangelista do Prado que se empregou na Prefeitura Muncipal como auxiliar do departamento de contabilidade, ficando ele também responsável pela continuidade da criação de seus sete irmãos: Estevão de Paula, Vicente Beltrão, Judith Henriques, João Benedito, Maria Madalena, Ana Gertrudes e Manoel Amâncio.

Estêvão era filho de família de abastado fazendeiro da região, da tradicional Família Prado, mas, foi fruto do amor de dois adolescentes. Foi registrado pelo avô,mas não recebeu do pai nenhuma atenção e amor. Fato esse que o marcou profundamente por ser ele um pai zeloso e carinhoso com os filhos, como conta minha mãe. Talvez ele não aceitava e não compreendia esse desprezo de um pai para com o filho. Isso justifica o seu procedimento por ocasião da morte do seu pai, quando recebera uma intimação levada por seus meio-irmãos residentes em Campanha, para comparecer à leitura do formal de partilha quando receberia o quinhão de 270 alqueires de terra, herança do seu pai, o que resolveria com certeza a situação da família.Mas, ele disse que não iria receber a herança de um pai que nunca o reconheceu como tal, que nenhum vínculo formou com ele, apesar do avô ter tido a ombridade de registrá-lo como membro da família. Por outro lado, disse ele que não iria tirar dos outros irmãos a vida com que estavam acostumados pois estes já exploravam o quinhão do irmão mais velho ausente e desconhecido destes.

Os meio-irmãos por parte de mãe decepcionados voltaram com o documento oficial nas mãos para entrega no fórum sem a manifestação do que seria o irmão rico que se tornaria meu avô.
Contava o meu tio mais velho, já falecido que meu avô era adepto da "Ordem Terceira de São Francisco", cujo princípio é o desprendimento de todos os bens materiais, o que tamém reforça a sua atitude com relação à herança do pai.

A família, a não ser o seu primogênito,também nunca concordou com isso, já que com a sua morte prematura,D.Mariinha ficou em situação financeira muito ruim pois naquele tempo não existia aposentadoria ou pensão, direito esse que ela só conseguiu já idosa, com o atendimento a pedido da família junto à Prefeitura Municipal.

Sua história com Cambuquira.

O casal ao chegar à Vila de São Sebastião de Cambuquira, com dois dos seus filhos mais velhos, não encontrou moradia na cidade que começava a se formar. Existia já alguns hotéis e pousadas. Mas, tudo aquilo era muito caro para alguém acostumado na "lida do campo" como se dizia antigamente. Assim, junto com Mariinha e filhos rumou para zona rural e, com a autorização de um proprietário de fazendas, foi morar provisoriamente numa gruta na beira do Rio Lambari, ali permanecendo até que pudesse construir uma casinha cuja propriedade ainda hoje pertence a um membro da família, o seu filho mais novo.
O "Seu Estevão" como ficou conhecido, era um homem alto, acima da média dos homens daquele tempo, que estimo ser mais ou menos de quase 1,90 m. Talvez, o seu tamanho e a sua inteligência e o espírito de comando o tenha facilitado as coisas e logo estaria trabalhando nas obras da cidade. Trabalhou na captação e montagem do abastecimento de água de Cambuquira à partir da Serra do Piripau, na construção do Aeroporto( hoje pertencente a Três Corações), na construção de ruas e praças entre outras obras.E, foi numa dessas obras, quando colocava os canos da rede de água no centro da cidade que quase morreu.Neste evento, um barranco desmoronou sobre ele, ficou soterrado vivo por alguns minutos. Os colegas de serviço o socorreram a tempo, mas aquilo com certeza lhe deixou sequelas e ele nunca mais teve a mesma saúde. Talvez seja isso o motivo de sua morte prematura.

Aqueles que o conheceram diziam que ele é dotado de muita inteligência, conhecimentos diversos, inclusive das plantas medicinais, predicado passado por um conhecido da família caboclo como ele ,criado no campo onde a farmácia era o pasto e bosque mais próximo e as ervas plantadas na horta. Por causa disso, ele era muito procurado pela população que o tinham como o "Curandeiro Seu Estêvão", termo que ele não gostava muito pois era católico fervoroso.

Tocador de viola, o que talvez justifica o dom de um neto que faz sucesso hoje com o mesmo instrumento, Tarcísio da Viola, atraia grupos para frente de sua casa onde a cantoria ia até tarde, quando também se "dançava" o cateretê e os grupos de "desafios", além dos eventos após terço que ele e sua esposa costumava realizar na residência na subida da Lavra.

Religioso, ao lado de sua esposa sempre realizava terços, participava dos leilões em prol das obras da igreja entre outras festividades religiosas, sempre com destaque não só na comunidade do Bairro da Lavra onde morava como também em outras partes da cidade. Contam que há poucos dias de sua morte, Estêvão já presentindo o fim despediu-se dos amigos, dos filhos e da adorada esposa que ele amava tanto.

Para ela, ele era um misto de marido e pai, pois o casamento aconteceu quando ela tinha pouco mais de 13 anos, uma criança que ia brincar de boneca enquanto o marido ia para lavoura.

D. Mariinha do Prado, anos mais tarde foi acometida de um mal que os médicos da época acharam ser um efeito colateral de um medicamento que ela tomou, o Elixir 1914. E, por anos ela sofreu daquele mal inexplicável que lhe deixou marcas na testa, nas pernas e outras partes do corpo. Graças a sua força e sua fé isso não a impediu de lutar e já recuperada, como se vê na foto ao lado, ainda ajudou criar uma penca de neto que estavam sempre com ela no dia-a-dia, ajudando-a montar o presépio de natal ou na hora daquele bolo de fubá feito na panela de ferro com brasas na tampa ao estilo antigo das fazendas dos seus pais num lugar chamao Xicão.
Na foto,vemos D. Maria do Carmo Rezende do Prado com o seu neto Gilberto Lemes, administrador deste blog com os seus 8 anos mais ou menos com as mãos nos bolsos e à direita o filho Manoel Amâncio do Prado tendo à sua frente os netos: Francisco Cesar, Nelson Nicolau, Antônio Fernando e Luiz Eduardo que não se intimidou com a máquina fotográfica e no exato momento fazia "xixi" ali mesmo (para que segurar? né?).
Bem, esta é uma história real cheia de garra e exemplo digna de ocupar esse espaço.

Abaixo:Cícero, Suely e Nenê Cassimiro dentro de uma das grutas históricas da cidade, onde provavelmente se instalou os primeiros membros da Família Prado no município.
Esta foto nos foi enviada graciosamente pela Professora Suely Vilhena, pesquisadora e historiadora de Cambuquira, que tempos atrás fazia uma pesquisa sobre a história de nossa cidade.

Cícero, filho de Manuel Amâncio do Prado, o mais novo dos filhos de Estêvão e Mariinha, a acompanhava nessa sua primeira visita à gruta histórica da cidade.

Infelizmente, conforme nos informaram essa formação natural de pedra já não existe mais. Talvez em consequência do desmatamento e da mudança climática veio abaixo numa noite quando um grupo de rapazes pernoitava no seu interior e que tiveram tempo apenas de sair correndo quando um "estalo" os avisou que tudo viria abaixo.

Um fenômeno d'outro mundo ou como se diz hoje, um "ufo", nos primeiros anos da Estância.

Estêvão e outros servidores que trabalhavam na montagem da canalização da água que vem do Piripau foram testemunhos de um acontecimento além da nossa imaginação. E, este fato foi contado por ele e pelos demais na cidade, que minha avó e meu tios passaram às gerações mais novas.

"La iam os operários comandados por Estêvão Horácio do Prado rumo à serra ainda de madrugada. Tinham que ir cedo para que a obra não atrasasse, como queria o prefeito da época, pois o turismo crescente exigia cada vez mais água nos hotéis e nas casas para atender tanta gente. Em fila caminhavam por um trilho no campo numa conversa animada quando uma luz apareceu e começou a seguir o grupo, ora mais baixo ora sobre as árvores. A princípio pensaram que fosse uma estrela, mas o foco foi aumentando e se aproximando do grupo que já amedrontados seguiam rumo ao local de trabalho. No entanto, aquilo já mais próximo continuou os seguindo de acordo com a velocidade dos seus passos.

Já havia algum tempo, quando um dos companheiros irritado com aquilo ou com medo, talvez por uma atitude de defesa, começou a gritar algumas palavras de baixo calão dirigindo-se ao estranho objeto brilhante. Contavam que aquilo de repente se investiu contra eles. E, como se atravessasse cada um passou pela fila desde o primeiro até o último e voltava em ziguezague entre as suas pernas. Repetiu isso por diversas vezes e depois como um foguete sumiu na escuridão.

Naquele dia, não houve trabalho, todos, inclusive meu avô, ficaram adoentados. Uns com dor de barriga outros com dores nas pernas. E, sem forças para enxada ou machado tiveram que voltar à cidade.

Minha avó e meus tios diziam que aquilo era uma assombração. Hoje alguns diriam que fora uma manifestação de algum extra-terrestre.

Só sei que isso foi um fato verídico que ficou sem as devidas explicações até hoje.

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Nota: Isso não está aqui só porque este é o blog de um dos descendentes desses pioneiros da cidade. E, foi postada para que as gerações mais novas tomem consciência de que a história de uma cidade ou de uma país se faz com o seu povo. E, ao contrário do que se colocou nos livros, os políticos, raras exceções, são meros coadjuvantes nesse processo histórico, às vezes até desempenhando muito mal os papéis que deveriam exercer com empenho.
Além dessa história, tantas outras deve existir por aí e que se perderão no tempo se ninguém ousar contá-las como eu. Sendo assim, se você tem conhecimento de fatos dessa natureza que conte neste blog para conhecimento de todos. Use o link "contato" da página para falar conosco.
Cateretê:
É uma das danças mais genuinamente brasileira. É de origem indígena, tal qual o seu próprio nome, tirado da língua Tupi. É uma espécie de sapateado brasileiro executado com "bate-pé" ao som de palmas e violas. Tanto é exercitado somente por homens, como também por um conjunto de mulheres. O Cateretê é conhecido e praticado, largamente, no interior do Brasil, especialmente nos Estados de Minas Gerais, São Paulo, Goiás e, também, em menor escala, no Nordeste. Em Goiás é denominado "Catira".


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